Conheceram-se na Avenida Atlântica, calçada da praia. Passaram quase um ano cruzando um pelo outro, ou correndo na mesma direção, sem se falarem. Até que um dia ele tomou coragem.- Desculpe...- Sim?- Esse seu macacão...- Francês.- Não é Adidas?- Não, não. É uma marca que não tem aqui.- Bacana.- Obrigada. Eu notei os seus tênis...- Ah. Estes me trouxeram dos Estados Unidos...- Devem ser bons.- São ótimos.A todas estas, correndo lado a lado.- Você faz a praia toda?- Não. Princesa Isabel, posto quatro.- Eu, posto quatro, fim do Leme.- Quantas vezes?- Quatro. Semana que vem, aumento para cinco.- Eu, três.- Ah.No dia seguinte se cruzaram e se abanaram. E todos os dias, depois disto, nunca deixaram de trocar palavras. Rápidas, quando se cruzavam. Mais demoradas, quando acontecia de emparelharem.- E então?- Tudo bem.- Quantas?- Já estou em quatro.- Eu em cinco.- Boa!Quando se aproximava dela por trás, ele ficava examinando o seu corpo. Mesmo dentro do macacão francês, era um belo corpo. Firme. Decidido. Em pouco tempo ela também chegaria a cinco.Um dia chegaram juntos à Princesa isabel e ele sugeriu:- Vamos até o fim do Leme.- Tá doido.- Vamos lá. Coragem.Ela foi. Foram e voltaram, lado a lado, no mesmo passo.- Você, hein? Me desencaminhou.Quando chegaram ao Posto 4, ela estava bufando. Ele adorava ouvi-la bufar.Um dia pararam para conversar em frente ao Lido. Pararam, não. Continuaram correndo, mas sem sair do lugar. Os dois suados, felizes. Ela prendia o cabelo atrás mas alguns fios se soltavam e grudavam no rosto suado. Pelos lados passavam os outros corredores. Gente de todos os tipos. Velhos conhecidos do calçadão. Uma irmandade.- Como tem gente fazendo jogging, né? - disse ele.- Sabe que eu não gosto dessa palavra?- É verdade. Bobagem.- Prefiro o português, mesmo.- Como é o português?- Cuper!Separaram-se às risadas. Ele, apaixonado.
Passaram a marcar encontro, todas as manhãs às sete na frente da Paula Freitas, e a correrem juntos. Até o fim do Leme. Ele pretendia aumentar para seis mas ficou nas cinco até que ela se condicionasse. E um dia, em frente ao Bolero, se beijaram. Foi difícil porque nenhum dos dois podia parar de pular, custaram um pouco até sincronizarem. Combinaram um programa para aquela noite. Os dois excitadíssimos.Ele foi buscá-la. Ela estava esperando em frente ao prédio onde morava. Ele teve um choque. Chegou a hesitar, na esquina, antes de se aproximar.- Oi.- Oi.Ela também parecia decepcionada. Pensando bem, era a primeira vez que se viam sem estar em movimento. Ela de vestido. Bem penteada. Maquiada. Enxuta.- Você está... diferente - disse ela.- Como assim?- Sei lá.Não foi um bom programa. Durante o jantar, não encontraram assunto. Acabaram falando de corrida. De corredores famosos. Ele disse que uma vez fora correr em Ipanema só para ver se encontrava o Millôr.- E encontrou?- Não.- Ah.Quando a deixou em casa, ele nem a beijou. Apertaram-se as mãos.- Nos vemos amanhã?- Claro!******Ele correu para a calçada da praia e já a encontrou pulando.Abraçou-a com entusiasmo. Ela também parecia contentíssima em vê-lo à luz do dia da manhã. Comentou:- Epa! Adidas nova.- Gostou?- Bacana.- Escuta, eu quero te fazer uma proposta.- Fala.- Hoje, vamos?- O quê?- Fazer seis?- Topo!E saíram na direção do Leme, bufando juntos.

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